quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Biografia de Clementina de Jesus é lançada em Sorocaba

Jornal Cruzeiro do Sul - 22/02/2017

Biografia de Clementina de Jesus é lançada em Sorocaba - GOOGLE COMMONS

Dentro da programação de Carnaval da Prefeitura de Sorocaba, será lançada hoje, às 20h, uma biografia da cantora Clementina de Jesus, de autoria dos jornalistas Felipe Castro, Janaína Marquesini, Raquel Munhoz e Luana Costa, formados pela Universidade Metodista de São Paulo. O evento, que ocorre no clube 28 de Setembro (rua Machado de Assis, 112) com entrada gratuita, contará com show de Márcia Mah apresentando o repertório de Clementina. 
  
A biografia Quelé, a voz da cor percorre desde a infância pobre da artista em Valença, no interior do Rio de Janeiro, até o momento em que desponta para a carreira artística, já passados mais de 60 anos de vida. "Ela era neta de escravos, negra, empregada doméstica e lançada artisticamente aos 63 anos de idade. Mais do que isso, ela contrariava o padrão estético e até artístico que dominava sobre as cantoras brasileiras, a imensa maioria delas com canto suave, soprano, enquanto a Clementina tinha o canto contralto, voz rouca, forte, algo muito diferente, muito ancestral", conta Janaína. 
  
Com as pesquisas, os jornalistas descobriram que Clementina de Jesus cantava coisas que levava na memória, cantos que ela ouvia quando era garota. "Sabia de cor inúmeras cantigas de trabalho, curimas e lundus, cantos ancestrais que levava consigo", comenta Janaína. Os jornalistas também levantaram que, depois de famosa, Quelé cantou e gravou com alguns dos maiores artistas brasileiros: Cartola, Pixinguinha, Paulinho da Viola, Milton Nascimento, João Bosco, Clara Nunes e Martinho da Vila, entre tantos outros. "Isso tudo evidencia que a história de Clementina é riquíssima, ela enquanto mulher, negra, sambista, representa um Brasil profundo, um Brasil do povo que não é comumente representado nos veículos de comunicação." 
  
A descoberta 
  
"O momento de Clementina foi aquele, surpreendendo todo mundo, já uma pessoa com mais de 60 anos de idade, fazendo sucesso. Não conheço ninguém que tenha feito isso, mas o que gostaria mesmo é que Clementina tivesse sido descoberta há mais tempo". As palavras são do poeta Hermínio Bello de Carvalho, que lançou a cantora Clementina de Jesus, no espetáculo Rosa de ouro, em 1965. O produtor conta que, naquela época, encontrou Clementina cantando em uma taberna, em um momento de descontração. Até então, ela trabalhava como empregada doméstica de uma família no Rio de Janeiro. 
  
Guardiã e herdeira da cultura musical afro-brasileira, dona de uma voz potente, Clementina gravou 12 discos de sucesso nos tempos da bossa nova e o do iê-iê-iê. Esteve em programas de TV, rádios, fez show pelo País e fora dele. Na França, cantou no Festival de Cannes e, no Senegal, teve de voltar ao palco quatro vezes, muito aplaudida. O jornalista Sérgio Cabral, que testemunhou a cena, no Festival Internacional de Arte Negra, relembra que as pessoas queriam tocá-la. 
  
Filha da primeira geração de descendentes de africanos libertados da escravidão, Clementina desde pequena ouvia a mãe cantar saberes ancestrais da cultura banto enquanto lavava roupas. O pai, um grande violeiro e capoeirista, completava a formação musical da filha. 
  
Clementina, ou Quelé, apelido que ganhou na infância, cantou desde pequena, na igreja, em festas religiosas, onde chegou a treinar pastoras, na casa das tias do samba, já no Rio, e nos corsos que deram origem às escolas de samba. Foi portelense, antes de entrar na Mangueira para nunca mais sair, por causa do amor ao marido que lhe acompanhou por 30 anos. 
  
Este ano, 2017, a morte da cantora completa três décadas e em fevereiro, se viva, ela teria completado 116 anos. 
  
Todas essas histórias em mais detalhes sobre os bastidores do mundo do samba entre 1960 e 1987 são apresentadas no livro Quelé, a voz da cor - biografia de Clementina de Jesus. A pesquisa sobre a artista começou com um trabalho de conclusão de curso na faculdade e depois de muitas idas e vindas ao Rio -- um esforço de pesquisa que levou seis anos-- terminou em uma publicação de 363 páginas, incluindo vasta bibliografia e índice onomástico, pela editora Civilização Brasileira. 
  
"A turma que fez este trabalho não escreveu apenas uma biografia", diz, em um trecho da orelha do livro, o escritor e historiador Luiz Antonio Simas. "O que estas páginas apresentam é um relato fundamental para se contar a história da nossa música e dos saberes africanos redimensionados no Brasil", completa um dos principais estudiosos da cultura do samba. 
  
O acervo do jornalista e agora Secretário da Cultura de Sorocaba, Werinton Kermes (que inclusive tem um documentário sobre Clementina), foi uma das referências para o livro. "O lançamento do documentário do Werinton, marca, em nossa opinião, um processo de resgate da cultura popular por meio da memória de Clementina de Jesus em Sorocaba. Por conta disso, não poderíamos deixar de fazer um lançamento na cidade", reforça Janaína. 
  
Clementina de Jesus terminou a carreira aos 86 anos, depois das gravações de Cantos escravos, em 1982, junto com outros músicos. Apesar da fama, morreu pobre como tantos artistas negros importantes para à música brasileira, como Pinxiguinha e Heitor dos Prazeres. (Com informações da Agência de Notícias RMS e da Agência Brasil) 


Nenhum comentário:

Postar um comentário